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quarta-feira, 11 de setembro de 2024

O caminho da servidão (XXXVII/2024)


“O que sempre fez do estado um verdadeiro inferno foram justamente as tentativas de torná-lo um paraíso”. — F. Hoelderlin

Quando cedemos a que o estado planejador defina nossas decisões na área da economia, estamos dando a ele o espaço para que coloque tudo debaixo de uma planificação nacional coletivista. Se você perde a liberdade de escolha acerca do que comprar, como e onde, deixando que o estado decida o que é melhor para o “social”, ele vai decidir cada vez mais e eu e você cada vez menos. Não queremos dinheiro como um fim em si mesmo, mas queremos dinheiro PARA alguma coisa. “Para alguma coisa” é a nossa decisão e o estado jamais deveria intervir sobre isso.

Precisamos, de fato, salvaguardar a liberdade individual e também entender que a democracia não é um fim em si mesma. A democracia não é a prova de que, enquanto ela existe, estaríamos protegidos da ditadura. O que nos protege da ditadura são limites de poder. Até em democracias podemos viver sob a opressão de regimes ditatoriais. E nada mais certo do que isso, quando vemos o que estamos vivendo atualmente na história do Brasil. Quem limita o poder do judiciário? Nas palavras de Rui Barbosa, “a pior ditadura é a ditadura do Poder Judiciário. Contra ela, não há a quem recorrer”.

O socialismo é o caminho da servidão, esta é a tese principal de Hayek em seu livro. Portanto, o que o autor nos mostra é que você não é feito escravo da noite para o dia. Há um caminho por que nós somos, passo a passo, levados ao abismo. Isto é o que se deu com a Itália, a Alemanha e a Rússia. O caminho não se dá politicamente, a princípio. É pela via econômica que o Estado vai conseguindo poderes cada vez mais invasivos na vida do cidadão comum, até que ele se imponha totalitariamente.

Enquanto lia o livro, eu tentava imaginar o que foi para ele ver, com a criação da ONU, Stalin sentar à mesa com os países livres. A presença de Stalin e, nos anos que se seguiram, dos demais dirigentes russos da antiga União da República Socialista Soviética foi a bancarrota do mundo livre e a condenação de vários países mundo afora. O uso da ONU para afundar a Coreia do Norte, a China, Cuba e tantos outros está muito bem documentado no livro “O comunista exposto”, de Cleon Skousen (veja aqui).

A fraternidade essencial e fundamental entre o marxismo, o nazismo e o fascismo está totalmente comprovada. As ideias socialistas estão carregando todos estes grupos para a formação de um Estado Totalitário. A Alemanha de Goethe e Humboldt sucumbiu às ideias socialistas e isso a levou ao regime totalitarista do Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães. Mais um livro que eu leio no sentimento da raiva, por ver que tudo o que poderíamos ter evitado nos últimos 30 anos estava escrito ali, desde 1943. Ninguém leu Hayek aqui na terra brasilis?

Como que o totalitarismo chega ao poder por meio das ideias socialistas explica a tomada do poder por Hitler na Alemanha, pelo Duce na Itália, por Stalin na Rússia. Este mesmo engodo brasileiro que durante décadas nos enganou entre uma “direita”, o PSDB, que se digladiava com uma “esquerda”, o PT; ambos, contudo, farinhas do mesmo saco comunista. Ninguém havia lido Hayek no Brasil, para que, então, pudesse nos alertar? 

A suprema tragédia, ainda não percebida, está em que, na Alemanha, foram em grande parte pessoas de boa vontade, homens que eram admirados e tidos como exemplos nos países democráticos, os que prepararam o caminho para as forças que agora representam tudo o que detestam — se é que eles mesmos não as criaram.

O livro de Hayek é muito bem escrito, claro e repleto de argumentos e fatos. Hayek ganhou o Prêmio Nobel de Economia em 1974. Para Rothbard, isto foi uma surpresa, pois, segundo suas palavras:

“Não apenas porque todos os Prêmios Nobel anteriores em economia tenham ido para progressistas à esquerda e opositores do livre mercado, mas, também, porque eles foram uniformemente concedidos para economistas que têm transformado a disciplina em uma suposta “ciência” preenchida por um jargão matemático e “modelos” irrealistas que são então utilizados para criticar o sistema de livre empreendedorismo e tentar planejar a economia através de um governo central” (em “Hayek e o Prêmio Nobel”)”.

Quando nos vemos trilhando o caminho da servidão, para Hayek, é que teríamos esquecido o verdadeiro caminho, mas qual seria o caminho esquecido? Seria o caminho do individualismo? O do capitalismo? Não, para Hayek, o caminho esquecido e abandonado é o caminho que fez o enriquecimento da Civilização Ocidental. Mas o que nos fez enriquecer? O livre-comércio? Não! Foi a nossa ética, a nossa moral individual defendida de forma cristalizada na primeira emenda da Constituição Americana. A ironia, para mim, é que a maior defensora e até mesmo responsável pelo desenvolvimento da ética individual no mundo Ocidental é a Igreja Cristã, todavia, é a partir dela que mais temos visto uma oposição ao individualismo. A igreja cristã foi fartamente usada e abusada para defender e expandir as ideias socialistas em várias partes do mundo. Se o real problema do homem não é nada que venha de fora, mas está no seu coração, isto já deveria ser suficiente para vermos o individualismo e o coletivismo dentro de esferas mais justas. A verdade, porém, é que a mentalidade revolucionária é criativa e fortemente adaptativa (para saber mais sobre isso, leia aqui).

O Estado planejador opta sempre pelo utilitarismo em detrimento da ética. Em outras palavras, o Estado sacrificará os direitos humanos alegando que está agindo pelo bem comum. Mas a pergunta que eu tenho martelando na minha cabeça é: de onde vem as pessoas que compõem o estado? Um dos capítulos do livro tem como título a seguinte pergunta: “Por que os piores chegam ao poder?”. Acredito que há uma pá de gente mal-intencionada, com sede de poder, mas poder para controlar a vida alheia. Há muita gente assim no meio privado, que sacrificam a ética individual, assassinam a reputação de quem não come na tigela que eles servem e que destroem quem se coloca como pedra de tropeço aos seus planos imperialistas. Essas pessoas não estão apenas trabalhando para/no Governo, mas podem estar se beneficiando dele em alianças espúrias e duvidosas. Essas pessoas estão também na iniciativa privada, nas escolas, nas associações, nos condomínios, nas igrejas! Agora, se ocorresse, de fato, uma livre concorrência, essas pessoas seriam limitadas pelas regras do mercado ou, cedo ou tarde, até expurgadas de onde se encontram. O mesmo não ocorre no estado. E a história recente do Brasil é uma prova do que estou escrevendo. Por isso que essas pessoas correm para exercer o que elas são no estado, mas debaixo da proteção da estabilidade de concursos públicos. De modo algum, estou dizendo que no estado só há os piores, longe disso. Há também os de boa índole e também os alienados, que são aqueles que não se dão conta que trabalham para perpetuar um leviatã que nos consome a todos.

Quem não se lembra do “fiscal do Sarney”? O governo congelou os preços e motivou as donas de casa a irem fiscalizar os estabelecimentos. Assim, o que a história recente nos ensina é que é preciso apenas uma justificativa palatável. Quem nos fez fiscais do nosso próximo? Qual a ética e a moral que me permitem intervir no empreendimento alheio? Não há ética onde existe coletivismo. Ou você garante os direitos humanos ou você impõe um estado planejador. As duas coisas ao mesmo tempo é uma grande utopia. Essa grande utopia veio para o Brasil sob a roupagem do PSDB — o partido dessa falácia chamada “social democracia”.

O que mais assusta (ou desanima) na leitura do livro é que estava tudo lá desde a década de 1940 e, mesmo assim, caminhamos a passos largos nesse caminho da servidão até chegarmos na situação crítica em que nos encontramos hoje. Assim, se definirmos “Estado de Direito” como a existência de leis que ajam de maneira igual sobre todos igualmente e que não haja ninguém que seja beneficiado por essa lei — a lei é para ser aplicada por uma justiça cega sobre todos, concluiremos, horrorizados, que não há um Estado de Direito no Brasil! Conta a mitologia que Plutão, o deus das riquezas, fora privado da visão por Júpiter e, manipulado por intrigantes que se aproveitavam de sua cegueira, Plutão concedia riquezas a quem não era merecedor de tê-las…

Esta história fez-me pensar na Justiça, que cega, deveria usar sua espada imparcialmente sobre ricos e pobres, mulheres e homens, independente da raça, cor e credo. Todavia, como no Brasil, tudo se inverte, não estaria nossa justiça também em mãos de intrigantes e, à semelhança de Plutão, não estaria ela concedendo seus tão caros benefícios a quem indubitavelmente não merece, corrompendo a razão original de sua cegueira? É o fim da verdade. O estado planejador terá como objetivo, para sua própria sobrevivência, o fim da verdade. 

                Fábio Ribas

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