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terça-feira, 23 de abril de 2024

Articulando em segurança (XIII/2024)


“…quando as instituições falham e as transgressões se instauram, o restabelecimento do respeito não se alcança diretamente, é preciso passar pelo estágio do temor. É necessário que quem infringe uma norma tenha em si incutido o receio das consequências em seus atos.
Não se trata, obviamente, de substituir a ação punitiva estatal pela reação. Legítima defesa não se confunde com justiçamento e não tem o objetivo de punir o agressor, mas de preservar a vítima. Ao viabilizá-la, o fundamental é criar o receio, ainda que em tese, de que o ataque seja resistido. Um equilíbrio pelo temor, diante do respeito perdido” (p. 181–182).

3º livro sobre a temática do desarmamento. O primeiro foi o “Armas de fogo” e o segundo, “Hitler e o desarmamento”. Os dois livros renderam, cada qual, o seu filme. O primeiro levou-me a assistir ao documentário “Desarmados” e o segundo, ao filme “Sophie Scholl”. Agora, Fabricio Rebelo, jurista, pesquisador em segurança pública e jornalista, apresenta um livro com muitos ensaios, nos quais vai contra-argumentando as falácias apresentadas na imprensa nacional sobre uma cobertura incorreta e maliciosa dos eventos que ela apresenta ao público.

Logo no primeiro artigo, ficamos sabendo da ideia ensandecida da ONU de criar um exército internacional dela, uma vez que ela pretendia desarmar todos os países. Gente! Parece coisa de fim de mundo, mas são ensaios sobre o que foi parar na imprensa nacional e mundial. Uma hora, essas ideias ensandecidas colam.

As ideologias que transformam as vítimas em culpadas, enquanto se comemora o afastamento dos bandidos das cadeias favorece a quem? Os direitos humanos não tratam as vítimas como humanas! Esta e tantas outras questões deste Brasil absurdo são discutidas neste livro, que revela um país de contradições e incoerências, como, por exemplo, o fato do Brasil ter rejeitado no referendo o desarmamento civil, mas a ideologia venceu e não se fez valer o desejo nacional. O país mais armado das Américas, os Estados Unidos, é o país com menor taxa de homicídios, enquanto o Brasil, com forte política desarmamentista, é o que possui mais de 50 mil homicídios ao ano e com taxa de solução de apenas 8% desses homicídios até a época da publicação dos ensaios do livro de Fabricio Rebelo. Países Europeus e os Estados Unidos têm índice de solução de seus homicídios na casa dos 70–80%, nosso índice de crimes não resolvidos é de 92%. Gente, isso é um caos! Destaque para o “ladrão da enxada”, que nos revela o quão nossa sociedade é medrosa.

A inversão dos valores e das soluções não acontecem somente aqui. Lá fora, o desastre de se responsabilizar a vítima também causa danos irreparáveis aos cidadãos de bem. Uma polícia casa vez mais despreparada tem sido um dos frutos amargos que temos colhido mundo afora.

O autor vai tratando de fatos nos momentos em que eles ocorrem, no Brasil e no mundo. São muitos contrapontos e a certeza que fica é que o Governo tem sua própria agenda ideológica, a despeito da vontade popular e, nisso tudo, a imprensa presta um imenso desserviço ao cidadão. Fabricio segue destruindo mitos e falácias, como, por exemplo, o mito que não devemos reagir ao assalto, pois é isso o que levaria o assaltante a matar (veja, a culpa é sempre da vítima). Os dados que mostram que a queda na venda de armas é proporcional ao aumento da violência também é tratado.

Duas indagações foram suscitadas pela leitura: 1ª) como é possível que, diante de números e fatos, não prevaleça o bom senso e o óbvio? 2ª) como está, atualmente, o mapa da violência? Este é citado diversas vezes e será muito interessante que continuássemos a acompanhar estes dados que trazem sempre uma triste e absurda realidade enfrentada pelo Brasil. Não são apenas os grandes centros urbanos, como Rio de Janeiro e São Paulo, que são dominados pelo crime organizado, enquanto o cidadão comum se vê cada vez mais refém desse terrorismo diário, mas o interior do Brasil com seus “novos cangaceiros”, as regiões de fronteira e o tráfico de drogas, além da bandidagem de grupos como o PCC e do Comando Vermelho, que seguem aliciando crianças para seu trabalho Brasil afora, compõem o retrato de um país cujas leis aprisionam o cidadão de bem e compensam o bandido.

Um dos tópicos trazidos é o da impunidade. O Brasil peca profundamente nesse quesito e isso dá aquela coragem necessária ao banditismo (e essa ousadia gerada pela impunidade anima aos bandidos em todas as esferas da nossa sociedade). Além disso, os dados mostram o fracasso do Estatuto do Desarmamento, que, desde sua implementação em 2004, só assiste ao crescimento do número de homicídios. Em outras palavras, estamos numa situação pior do que estávamos antes do Estatuto, então, por que não revogá-lo?

Em um dos ensaios, agora à parte de tudo o que tratei até aqui, o autor discute sobre a chacina ocorrida em Aurora, num cinema, nos Estados Unidos. Na hora, lembrei-me de uma reportagem publicada na época desses crimes e que deixarei aqui. A reportagem (site Terra, o link para a reportagem está no título abaixo) fala de jovens namorados que morreram protegendo com seus corpos suas namoradas durante o tiroteio.

            Fábio Ribas


Jovens deram a vida para salvar namoradas no massacre de Aurora

“Em meio à tragédia no massacre que tirou a vida de 12 pessoas no Colorado, emergem histórias de heroísmo. Três mulheres que assistiam à estreia de Batman — O Cavaleiro das Trevas Ressurge em um cinema em Aurora, no Estado americano do Colorado, tiveram suas vidas salvas graças à proteção de seus namorados — que morreram no local.

“Jansen Young, Samantha Yowler e Amanda Lindgren sobreviveram ao ataque da última sexta-feira porque seus namorados deram a vida para salvá-las. Quando perceberam os tiros disparados por James Holmes, que entrou pela porta traseira do cinema Century 16 com dois revólveres, uma espingarda e um fuzil, os três homens reagiram instintivamente jogando os corpos sobre elas de encontro ao chão, para protegê-las.

“Ele é um herói, e nunca será esquecido”, disse, às lágrimas, a namorada de Jon Blunk. “Ele levou um tiro por mim.” Blunk, um ex-militar de 26 anos, teve interrompido o sonho de um dia integrar os Navy Seals — principal força de operações especiais da Marinha dos Estados Unidos. Jansen Young, 21 anos, foi levada pelo namorado à estreia de Batman para comemorar sua formatura em Veterinária.

“A história do casal Matt McQuinn e Samantha Yowler teve um fim parecido. A primeira reação que Matt, 27 anos, teve quando o tiroteio foi deflagrado foi mergulhar sobre a sua namorada para protegê-la. Ela levou um tiro no joelho e passa bem; ele morreu no local.

“Perdemos uma grande pessoa e ainda não conseguimos acreditar que ele se foi”, afirmou um ex-colega de Matt, que trabalhava em uma loja da Target, onde ele conheceu Samantha.

“O ato de coragem foi repetido por Alex Teves, que morreu salvando a vida da namorada, Amanda Lindgren. Após a confirmação de sua morte, uma amiga identificada como Caitlin postou no Twitter: “Um dos melhores homens que eu conheci na minha vida. O mundo já não é um lugar tão bom sem ele”.

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