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segunda-feira, 8 de julho de 2024

Insegurança Pública (XXIV/2024)


Após o prefácio de Youssef Abou Chahin, ex-delegado-geral da Polícia civil de São Paulo, o autor nos dará as origens históricas do surgimento das tropas de elite. Além do BOPE e uma crítica ao filme Tropa de Elite, Diógenes Lucca falará sobre o GATE, a SWAT e o ROTA. No GATE, o autor foi testemunha ocular de um episódio que quase encerrou o recém-criado Grupo de Operações Táticas Especiais (GATE): o caso da Professora Adriana Caringe. 

Não dá nem para imaginar a tensão e o stress como os enfrentados por esses policiais, desde as crises com reféns, com suicidas, as operações em meio a multidões etc. Por isso, Diógenes Lucca, Tenete-Coronel veterano da Polícia Militar do Estado de São Paulo e fundador do GATE, também ressaltará as várias características que deve ter um policial de elite. O alvo do autor, quando à frente do GATE, era desenvolver a tal ponto a credibilidade da tropa diante da opinião pública que até mesmo o criminoso os chamasse para intermediar as situações de negociação. Entretanto, ao ler isso, vi com tristeza e frustração tal intento hoje, pois, para mim, é impensável imaginar um resgate de credibilidade militar diante da população brasileira num Brasil pós-oito de janeiro 

Logo no primeiro artigo do livro, “O estado de segurança pública no Brasil”, Diógenes Lucca faz um verdadeiro raio-X de nossa situação de caos nacional, apontando os problemas e mostrando as soluções possíveis. Revela o problema de se deixar levar pelas soluções eleitoreiras e midiáticas. Enfatiza a importância da coalizão entre as forças policiais nas soluções para o problema da Segurança Pública, o papel dos Estados e, principalmente, o papel de São Paulo como exemplo para os demais. 

O Brasil já passou por vários absurdos no trato com o crime organizado, inclusive do Estado se colocar nas mãos de criminosos. Todavia, não há como ler este livro e pensar que o sistema hoje está muito mais favorecendo os crimes do que disposto a combatê-los. A sensação é que, finalmente, o crime organizado colocou seus representantes no Congresso e no Judiciário (e no Executivo) — o que esperar da “democracia”, não é mesmo? 

O capítulo sobre segurança pública e segurança privada lembrou-me muito o livro “Defenda-se”. Contudo, os livros discordam entre si em alguns posicionamentos quanto a como devemos nos comportar diante do crime que nos assola diariamente. Ele falará sobre os agentes de segurança privada e também os que trabalham com carro-forte. Algo muitíssimo positivo são as sugestões de pequenas ações que poderiam ajudar, como, por exemplo, se uber’s e táxis, caso quisessem, fossem munidos de rádios com acesso direto à polícia, podendo, assim, anunciar situações suspeitas caso as encontrassem. Neste ponto do livro, eu já posso começar a delinear o meu descontentamento com a visão não armamentista do autor. Na verdade, quando o autor trata de segurança pública, ele nunca leva em conta o cidadão, mas apenas as forças do Estado. Assim, ler este livro de um policial brasileiro, logo após o “Defenda-se”, que é um livro de um policial americano, mostra como que as duas cosmovisões são bem diferentes. Nos Estados Unidos, a questão da segurança pública passa pelo cidadão e, não apenas isso, torna-o agente. A posição de Diógenes Lucca mostra como que a ideologização do tema turva o próprio posicionamento do policial brasileiro em enxergar no cidadão de bem um aliado armado para proteção na segurança pública.

A própria crítica ao filme “Tropa de elite”, feita por Diógenes, eu a li como uma crítica enviesada ideologicamente por duas frentes. Primeira, Diógenes é policial e protege a imagem da corporação. Como eu disse, ele elenca uma série de características que policiais devem ter para participarem de tropas de elite, mas, ao fim, diz que tais características não querem sinalizar que tais policiais estão acima dos demais e que, na verdade, tais características devem estar presentes em todos. Todavia, a impressão que fica é que são características que os diferenciam dos demais e que também os diferenciam do cidadão comum. Tudo isso só inviabiliza a possibilidade desse cidadão ter seu porte de arma para participar do plano de segurança, tanto na defesa de sua casa como das ruas. Segunda frente, o autor não vê que o filme é um recorte de uma realidade específica e que o cidadão, exatamente esse não levado em conta, aprovou o filme.

A Editora do livro de Diógenes é a Vide Editorial. A mesma que publica as obras do já falecido Olavo de Carvalho e, ironicamente, a mesma que publica o “kit desarmamentista”. Mas Diógenes segue na contramão, dizendo que o cidadão deve se submeter ao criminoso, para não irritá-lo. Embora o livro seja muitíssimo bom em nos descrever a situação da polícia, os problemas enfrentados nas ruas diante de um Governo que não possui um plano de segurança nacional, em nenhum momento, o autor defende o direito armamentista do cidadão. Surpreendentemente, o livro, que segue tratando da realidade da insegurança pública no Brasil e que até apresenta algumas soluções ao longo das suas páginas, contudo, ao chegar ao seu desfecho, deixa no leitor uma sensação de desespero. O livro terminará deixando um gosto amargo em nossas bocas, uma impressão de que o caos é de tal magnitude e que o poder paralelo do crime organizado é de tal envergadura, que, no fim de tudo, estamos nas mãos de um poder policial que não tem a mínima condição de estar presente quando precisarmos dele. Então, fica a pergunta: por que não armar o cidadão, preparando-o para ser um aliado da polícia em meio à incompetência e corrupção de um Estado que não é Deus?

            Fábio Ribas

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