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segunda-feira, 22 de julho de 2024

Teologia, Piedade e Missão (XXX/2024)


Os que são chamados por Deus para a salvação são simultaneamente enviados por Deus para a missão — Ronaldo Lidório
Um dos maiores desafios missionários, portanto, não é andarmos na contramão do mundo, mas na contramão do nosso próprio coração — Ronaldo Lidório

É preciso plantar igrejas! É preciso que haja um povo local que adore a Deus coletivamente. É preciso que possamos nos encontrar, ajuntar, orar e nos apoiarmos uns aos outros. É preciso que nossas igrejas locais plantem outras igrejas. É preciso que compreendamos qual é, de fato, a Missão da Igreja.

Lendo o livro de Ronaldo Lidório sobre Gisbertus Voetius, que nunca antes havia ouvido falar, a não ser por Lidório mesmo, vemos que muito do que temos hoje como propostas missiológicas estão longe das bases doutrinárias da Reforma Protestante. Gisbertus Voetius, que participou da elaboração dos Cânones de Dort, é tido como o primeiro protestante a propor que a questão missionária fosse levada para dentro da academia. Ele compreendia que o plantador de igreja deve ser alguém que estude teologia e filosofia, além de outras disciplinas como medicina, por exemplo. Voetius defendia que o plantador precisava ser um grande conhecedor da Palavra, mas que também precisava entender o pensamento do povo. Neste sentido, ele adianta o que hoje defendemos por meio da antropologia missionária.

A missão é falar de Jesus e sua pessoa e obra salvífica, é ensinar o que ele Jesus já fez por nós e ainda fará — esta é a defesa de Voetius. Todavia, um dos destaques de Voetius era a sua ênfase numa teologia prática, uma teologia que frutificasse no avanço da Igreja e na vida pessoal de seus membros. A missiologia de Voetius é trinitária e teocêntrica. A missão aponta para o Deus triuno em ação, visando a Sua glória. Outro motivador da missão é a doutrina da eleição eterna. No seu tempo, Voetius investiu fortemente na evangelização dos católicos, ateus e muçulmanos. Assim, as reflexões de Voetius vem ao encontro dos anseios da nossa geração por uma missiologia reformada e calvinista, colocando o fundamento e a motivação da Igreja na Bíblia e não na cultura ou nas necessidades dos povos ou dos perdidos. A missão é de Deus. É iniciativa dEle, para a glória dEle e mostram o seu amor e justiça.

Ronaldo Lidório nos apresenta a vida e obra deste importantíssimo protestante e que, sem sombra alguma de dúvida, levará o leitor a conectar novamente o Evangelho com a sua teoria e prática missionárias, em piedade. Um livro fundamental e de cabeceira para todo o missionário reformado calvinista. Abaixo, deixo um trecho do livro.

“Após a Segunda Grande Guerra, missiólogos passaram a falar sobre a missio Dei (missão de Deus), em boa parte influenciados pela missiologia de Voetius e seus sucessores. É preciso, porém, esclarecer que o conceito de missio Dei proposto nas últimas décadas separou-se consideravelmente da sua compreensão original.

“O teólogo e missionário Peter Pikkert expõe que, a partir dos anos 1950, a missio Dei ganhou contornos generalistas com base na premissa de que a missão de Deus é restaurar todas as coisas em Cristo Jesus, e que, dessa forma, a missão da Igreja seria participar da missão de Deus. Nessa elaboração, todas as iniciativas, ações e parcerias que podem fazer do mundo um lugar melhor passaram a ser vistas como missão, igualando a pregação do evangelho às ações sociais, ecológicas e ambientais.

“Pikkert alerta que, nessa compreensão, todos os seres humanos, cristãos e não cristãos, dispostos e envolvidos com o bem-estar da humanidade e do planeta, estariam cumprindo a missão, perdendo a missio Dei o núcleo de seu significado.

“Kevin DeYoung e Greg Gilbert, em linha similar, defendem que tal generalização é prejudicial ao conceito bíblico de “missão” e ao conceito teológico de missio Dei. Afirmam que a missão da Igreja não é restaurar todas as coisas, mas fazer discípulos, e expõem que essa é a missão da Igreja, seu chamado central, como resultado da comissão dada por Cristo ao seu povo (Mt 28:16–20).

“A posição de Voetius a respeito da missio Dei se enraíza na sua proposta original, que remonta ao século 4, descrevendo os atos da Trindade na redenção humana: o Pai planejando a redenção em amor e justiça; o Filho provendo redenção por meio do seu sacrifício; o Espírito Santo efetivando o plano de redenção, convertendo e selando os salvos. E, assim, a Igreja tem a responsabilidade e o privilégio de proclamar essa missão de Deus, efetivada por meio do Pai, Filho e Espírito Santo, a todos, fazendo discípulos de todas as nações. Dessa forma, a compreensão e influência de Voetius quanto à missio Dei defendem que o núcleo da missão da Igreja é a evangelização”. 


                    Fábio Ribas

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